Baterias: a infraestrutura da nova matriz energética brasileira

By Marilia Criscuolo In Bolt Labs

23

maio
2025

O mercado global de baterias caminha para ultrapassar 1.000 GW de capacidade instalada até 2040. Países como China, Estados Unidos, Coreia do Sul e Alemanha lideram esse avanço com investimentos maciços em tecnologia, inovação e políticas industriais.

O Brasil, por sua vez, tem uma oportunidade concreta de participar desse movimento — não apenas como consumidor de soluções importadas, mas como protagonista de uma indústria nacional estratégica. Se temos tanto potencial, por que o Brasil ainda não está nessa?

Com uma matriz elétrica majoritariamente limpa, nosso país vive um paradoxo: temos energia renovável em abundância, mas esbarramos na imprevisibilidade e intermitência de fontes como solar e eólica. A resposta para esse desafio já existe: armazenamento por baterias. Não se trata mais de uma promessa tecnológica — é uma necessidade operacional e estratégica para o momento presente do setor elétrico brasileiro.

O Brasil reúne condições únicas para desenvolver uma cadeia nacional de armazenamento: dispõe de matérias-primas estratégicas (como lítio e níquel), energia renovável barata e um mercado interno em expansão. O desafio está, justamente, em superar a dependência tecnológica e criar um ambiente favorável ao investimento.

Flexibilidade que gera mais confiabilidade

Fontes como solar e eólica não geram energia o tempo todo, e nem sempre quando o sistema mais precisa. Com baterias, é possível armazenar o excesso de energia gerado em momentos favoráveis e liberá-lo nas horas de maior demanda. Essa simples capacidade de deslocar geração no tempo traz profundos impactos: estabilidade, previsibilidade e segurança ao sistema elétrico.

Sem essa flexibilidade, a expansão das renováveis corre o risco de ser limitada. Com o armazenamento em baterias, o setor elétrico ganha resiliência e reduz sua dependência de usinas térmicas caras e poluentes — que hoje ainda são acionadas por algumas companhias em horários críticos para garantir o fornecimento. As vantagens do armazenamento por baterias vão além da previsibilidade. Elas reduzem o acionamento de termelétricas, cortando custos e emissões, melhoram a estabilidade da rede elétrica, com regulação instantânea de frequência e tensão.

Além disso, respondem em milissegundos a variações de carga — muito mais rápido que qualquer térmica e podem ser instaladas em diferentes escalas, inclusive junto à carga, minimizando perdas na transmissão. Com esses atributos, as baterias tornam o sistema elétrico mais eficiente e alinhado com as metas que o Brasil assumiu.

No entanto, o país ainda não possui ainda um marco regulatório específico para baterias. Também faltam sinais econômicos claros para remunerar os serviços prestados por essa tecnologia — como regulação de frequência, reserva girante e estabilidade de tensão. O custo inicial, embora em queda global, ainda representa um obstáculo relevante sem estímulos adequados.

Mas, como transformar esse potencial em realidade?

Será preciso articular uma agenda estratégica que envolva leilões de capacidade e flexibilidade com participação de baterias e remuneração por serviços ancilares, que complementam os serviços principais de geração, transmissão, distribuição e comercialização refletindo o valor real da flexibilidade oferecida.

Na esfera federal, para avançarmos, será necessária a criação de crédito acessível via BNDES e fundos climáticos, fomento à pesquisa e desenvolvimento, com estímulo à indústria nacional e uma política de expansão descentralizada, inspirada no modelo de sucesso da geração solar distribuída. Ou seja, termos uma “Embrapa das Baterias” — um centro de excelência tecnológica —  poderia ser um passo decisivo para garantir soberania e inovação nesse setor-chave para o futuro energético do país.

O uso estratégico de baterias também abre portas para outras frentes: ampliação do acesso à energia em comunidades remotas (substituindo geradores a diesel), estabilização da geração distribuída, criação de empregos qualificados e até exportação de soluções integradas de energia limpa e armazenamento para países em desenvolvimento.

Com um potencial técnico de mais de 30 GW em serviços ao sistema elétrico, o armazenamento em nosso país pode ser a ponte entre segurança energética, competitividade industrial e inclusão social.

O Brasil não precisa esperar para ser parte desse futuro — ele já tem as ferramentas e os recursos. O que falta é uma visão de longo prazo, com políticas estruturadas que enxerguem o armazenamento como parte central da infraestrutura energética do século XXI. As baterias não são mais coadjuvantes. Elas são a base de uma matriz mais limpa, segura e eficiente. E o momento de colocá-las no centro da estratégia nacional é agora.

Por Gustavo Ayala (CEO Bolt) – 23/05/2025
Canal Solar